sexta-feira, 13 de abril de 2012

Penas restritivas de direitos: aplicação, requisitos, modalidades

Depois de conversar sobre as generalidades que cercam as penas restritivas de direitos, entendo ser bem pertinente fazer mais considerações sobre as hipótese e os requisitos para a substituição, além de destrinchar cada uma das modalidades. 


Para fazer a substituição, o magistrado deve observar dois tipos de requisitos: 


a) um requisito objetivo, ou seja, focado na natureza do crime, e não no condenado: 

  • aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo; [ou seja, não é qualquer quantidade de pena aplicada - nem a qualquer tipo de crime - que se aplica a substituição. O máximo de pena para a qual se permite fazer a substituição? Quatro (4) anos, ou seja, baixa lesividade, ocasionando, assim, por respeito ao postulado de proporcionalidade, uma intervenção penal adequada, necessária e proporcionalmente (em sentido estrito) firmada numa regra de ponderação: prisão para os casos de reconhecida necessidade. Além disso, o crime não pode ter sido praticado por meio do uso de violência ou grave ameaça à pessoa. Daí podemos pensar, por exemplo, nos crimes complexos, como o roubo, que envolve patrimônio e liberdade, para o qual não é possível fazer a substituição. No caso do furto é possível, porque não envolve violência ou grave ameaça à pessoa, mas ataque ao patrimônio isoladamente]. No caso de crime culposo podemos irrestritamente aplicar a substituição, tendo em vista se tratar de delito menos reprovável, em face do elemento subjetivo se firmar na negligência, na imprudência ou na imperícia, não denotando vontade livre e deliberada de atingir o tipo penal (como se vê no crime doloso). Os casos de acidentes de trânsito ilustram bem a aplicação de pena restritiva de direitos, nada obstante as penas serem maiores do que 4 anos. 

b) um requisito subjetivo, focado na pessoa do condenado

  • culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente;
  • réu não reincidente em crime doloso. Bom, se o cidadão está na "mesma", ou seja, descumprindo a norma e se antagonizando ao ordenamento (lembram da lealdade ao ordenamento?), não será adequada a medida de substituição, porquanto está dando manifestação concreta que a medida que outrora já fora adotada pelo juiz (por exemplo, na outra condenação) demonstrou que a prevenção especial não foi alcançada. 
O CPB traz um roteiro quantitativo em relação às penas que serão aplicadas, bem como o tratamento conferido pela lei ao reincidente "gente boa" (apesar de reincidente, o juiz vê "luz no fim do túnel"):
  • na condenação igual ou inferior a um ano, a substituição pode ser feita por multa ou por uma pena restritiva de direitos: aqui temos a proporção 1:1, ou seja, em penas iguais ou inferiores a 1 ano (baixíssima lesividade), 1:1, 1 MULTA OU 1 PENA RESTRITIVA DE DIREITOS [perceba que, mais uma vez, multa não é pena restritiva de direitos, pois até mesmo aqui vemos a distinção.
  • na condenação superior a um ano, a pena privativa de liberdade pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa ou por duas restritivas de direitos; aqui temos 2:2, ou seja, 1 PENA RESTRITIVA DE DIREITOS + MULTA ou 2 RESTRITIVAS DE DIREITOS.
  • no caso de condenado reincidente, o juiz poderá aplicar a substituição, desde que, em face de condenação anterior, a medida seja socialmente recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime (reincidência específica). Aqui se trata de uma "ponte de ouro" - sujeita ao poder discricionário do magistrado (ele pode, não é obrigado), deferindo-se a substituição para o reincidente, com a advertência de observar o juiz que a medida será recomendável (cumprirá a finalidade da pena), além de a reincidência não poder ser no mesmo crime (furto, furto) ou em crimes de mesma natureza (furto, apropriação indébita, que têm o mesmo bem jurídico tutelado).
PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA (art. 45, §1o): a prestação pecuniária tem caráter indenizatório e consiste no pagamento de dinheiro à vítima, seus dependentes ou entidade pública ou privada com destinação social (só se não houver dano ou se não houver vítima imediata/parentes é que o pagamento irá para entidade pública ou privada com destinação social). Algumas considerações:

  • consiste, como afirmei atrás, em forma de reparação do dano, pois o valor pago deve ser abatido do valor da condenação civil. Daí a doutrina (Prado, Bitencourt) doutrina defende JECrim (compensação da prestação pecuniária decorrente de transação penal ou condenação em audiência – art. 81, lei 9099/95 – com eventual composição civil – em se tratando de ação penal pública incondicionada, pois nas outras, a composição civil faz extinguir a punibilidade).
  • fixação: entre 1 e 360 salários mínimos, havendo uma discussão interessante em relação à liberdade do juiz de fixar um valor em cima do salário mínimo  – constitucionalidade (vide CF, art. 7o, IV, in fine).


PRESTAÇÃO DE OUTRA NATUREZA – INOMINADA (art. 45, §2o): consiste em prestação de outra natureza (cestas básicas, medicamentos, etc.) que não de natureza pecuniária (multa, perda de bens ou valores nem prestação pecuniária). Em relação à ela subsiste um debate sobre sua constitucionalidade, já que se trata de pena inominada e indeterminada (reserva legal). Está sujeita aos seguintes requisitos:

  • caráter consensual (concordância prévia do beneficiário).
  • aplicação pelo juízo monocrático.

PERDA DE BENS E VALORES (art. 45, §3o): trata-se de uma penalidade de confisco que se destina ao Fundo Penitenciário Nacional e não pode se confundir com o confisco-efeito (instrumentos e produtos do crime, de acordo com o art. 91, II, a e b) do CPB, que é efeito secundário da sanção penal. A perda de bens incide sobre o maior dos valores:

  • o montante do prejuízo causado;
  • o provento obtido pelo agente ou por terceiro pela prática do crime.

PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE OU A ENTIDADES PÚBLICAS (art. 46): essa é a "menina dos olhos" das penas restritivas de direitos, sendo uma das mais aplicadas, dado o caráter pedagógico de que se reveste. Consiste na atribuição de tarefas gratuitas ao condenado (de acordo com as suas aptidões, que deverá ser cumprida em entidades assistenciais, hospitais, escolas, orfanatos e outros estabelecimentos afins, em programas comunitários ou estatais) e está sujeita às seguintes regras:

  • aplicável às condenações superiores a 6 meses de privação de liberdade, pois as penas inferiores a 6 meses estão sujeitas a outras penas alternativas, não de prestação de serviços à comunidade, já que não seria pedagógico efetuar serviço em penas baixas;
  • calculada na proporção de 1 hora de trabalho para 1 dia da condenação (ou seja, 1:1). Nesse sentido, a prestação de serviços deve, em regra, ter a mesma duração da pena privativa de liberdade cominada (art. 55). assim, por exemplo, uma pena de 9 meses de detenção dá origem à pena de 9 meses de prestação de serviços à comunidade. 
  • se a pena substituída for superior a 1 ano, poderá o condenado cumprir a pena de prestação em menos tempo, nunca inferior à metade da pena privativa de liberdade fixada. Assim, o agente pode trabalhar mais de 1 hora por dia, para cumprir a pena em menos tempo, MAS nunca inferior à metade do tempo da pena fixada. (art. 46, § 4º). Se, por exemplo, uma pessoa for condenada a 1 ano e dois meses, não poderá "correr tanto" e cumprir, acumulando horas, em cinco meses, pois a regra pretende justamente que se "alongue" o tempo para que o caráter pedagógico possa ser desenvolvido.

INTERDIÇÃO TEMPORÁRIA DE DIREITOS (art. 47): consiste na proibição do exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de mandato eletivo e tem as seguintes características:

  • suspensão temporária, ou seja, não se pode prolongar ad eternum a pena, pois viola a CF/88 (vedação de penas de caráter perpétuo).
  • não precisa ser crime contra a Administração Pública [violação dos deveres inerentes ao cargo, função ou atividade], mas tudo que envolve o mau uso do direito.
  • NÃO SE CONFUNDE COM A PERDA DO CARGO, porque se trata de efeito secundário da condenação, de acordo com o art. 92, I do CPB, ou seja, cumulável com pena privativa de liberdade;
  • aplicada ante a proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que dependam de habilitação especial, de licença ou autorização do poder público;
  • decorre do crime cometido com prática de violação dos deveres de profissão, atividade ou ofício [ou seja, profissão em que ocorreu o abuso, não envolvendo outras profissões que o agente possa exercer.
  • CASOS ESPECÍFICOS:
  • suspensão de autorização ou de habilitação para dirigir veículo, aplicável somente para crimes culposos de trânsito quando, à época do crime, o condenado era habilitado ou autorizado a dirigir). Não se aplica à permissão para dirigir veículos (art. 148, §2o, CTB) porque não prevista em lei essa pena.
  • proibição de frequentar determinados lugares: restritiva de liberdade, e não de direito [relação lugar/PERSONALIDADE], ou seja, não se destina a qualquer tipo de crime, lugar ou infrator.
  • aplicada apenas aos delitos relacionados ao mau uso do direito interditado, de caráter preventivo especial e geral.
  • não se confunde com os efeitos da condenação do art. 92, visto que estes são sanções éticas ou administrativas, e não penais.

LIMITAÇÃO DE FIM DE SEMANA (art. 48): consiste na obrigação de permanecer, aos fins-de-semana, por 05 (cinco) horas diárias, em casa de albergado ou outro estabelecimento adequado, no qual serão ministrados cursos e tarefas educativas. 


E se houver o descumprimento da pena restritiva de direitos? O art. 181 da Lei 7.210/84 (LEP), que estabelece as hipóteses:


No caso de descumprimento da pena de prestação de serviços à comunidade:
a) não for encontrado por estar em lugar incerto e não sabido, ou desatender a intimação por edital;
b) não comparecer, injustificadamente, à entidade ou programa em que deva prestar serviço;
c) recusar-se, injustificadamente, a prestar o serviço que lhe foi imposto;
d) praticar falta grave;
e) sofrer condenação por outro crime à pena privativa de liberdade, cuja execução não tenha sido suspensa.
  • será convertida quando o condenado não comparecer ao estabelecimento designado para o cumprimento da pena;
  • recusar-se a exercer a atividade determinada pelo juiz;
  • se ocorrer qualquer das hipóteses das letras a, d e e acima.

No caso de descumprimento da pena de interdição temporária de direitos:
  • será convertida quando o condenado exercer, injustificadamente, o direito interditado ou se ocorrer qualquer das hipóteses das letras a e e acima.


MULTA (art. 49): a multa pode ser uma sanção autônoma e substitutiva da pena privativa de liberdade, quando vier SOZINHA, no lugar da prisão. Pode ser acessória, quando acompanha a prisão. Em que consiste a multa?

  • pagamento ao fundo penitenciário da quantia fixada na sentença e calculada em dias-multa. Ou seja, a multa NÃO VAI PARA O BOLSO DA VÍTIMA, ao contrário da prestação pecuniária.
  • usamos o valor de referência de (dias-multa), no mínimo, de 10 (dez) e, no máximo, de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa.
  • valor do dia-multa é fixado pelo juiz.
  • não pode ser inferior a um trigésimo do maior salário mínimo mensal vigente ao tempo do fato, nem superior a 5 (cinco) vezes esse salário.
  • valor da multa será atualizado na execução, pelos índices de correção monetária.
  • o pagamento deverá ser feito dentro de 10 (dez) dias depois de transitada em julgado a sentença e pode ser parcelado a requerimento do condenado e conforme as circunstâncias.
  • é possível que a restritiva seja descontada no vencimento ou salário quando aplicada isoladamente, aplicada cumulativamente com pena restritiva de direitos ou quando concedida a suspensão condicional da pena. Dentro disso, o desconto não deve incidir sobre os recursos indispensáveis ao sustento do condenado e de sua família.



  • será convertida em dívida: a partir do trânsito em julgado a sentença condenatória, a multa será considerada dívida de valor (dívida ativa da Fazenda Pública, inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição). Importante lembrar que haverá a  suspensão da execução da multa ante a superveniência de doença mental.










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