sexta-feira, 21 de junho de 2013

Direito, ética e moral

Eis um grande desafio na democracia: as linhas tênues entre Direito, Ética e Moral. Isso porque, muitas das discussões que envolvem pluralismo político e representatividade de grupos passa pelas distinções em relação aos valores partilhados em grupo.

O Direito - entendido no âmbito da dogmática jurídica como um ramo do conhecimento humano responsável pela instrumentalização das normas, leis responsáveis pela ordenação das condutas e pela administração de conflitos - tem como pressuposto a universalidade, generalidade, bilateralidade, abstração, formalidade no que diz respeito à elaboração legislativa, o que, dentro da CF/88 traz um compromisso em termos de homogeneidade.

O que isso quer dizer?

Simples: o Direito (ou direito, sabe-se lá) almeja regrar universalidades, atingindo, assim, dentro de um Estado, todos e todas cidadãos e cidadãs. Daí o caráter de heteronomia, bem como, no mínimo, de bilateralidade, já que não existe Direito numa ilha deserta habitada por um ser humano só (ou seja, somente existirá Direito quando Robinson Crusoé encontrar Sexta-feira, pois, antes disso, não existe necessidade de ordenação social, já que não se está sob a égide de sociedade). 

Com isso destaca-se o Direito da Moral, que também envolve sistema ou conjunto de regras sociais, mas desprovida de coercitividade e coatividade ESTATAL, uma vez que os valores morais variam em função dos grupamentos sociais distintos (grupamentos sociais distintos, valores morais distintos). A moral é, ainda, autônoma, ou seja, um sistema auto-suficiente de regramento, diferentemente do Direito que, sendo heterônomo, regra-nos em cima do que preceitua formalmente o Estado (hetero = diferente + nomos = regrar, normatizar). 

Kelsen, por ocasião da Teoria Pura do Direito, pretendeu dissociar do estudo da dogmática jurídica e, portanto, do Direito (já que ele entende que a expressão do Direito consiste na própria norma), da moral, criticando, com isso, a teorização jurídica de Kant em cima da elaboração conjunta entre moral e direito. Mas, uma pergunta: o Direito estará dissociado completamente da Moral?

Para a teoria do mínimo ético de Jeremy Bentham não, na medida em que o Direito seria, para o autor, o mínimo de moral que agrega a formulação do ordenamento jurídico. A teoria do mínimo ético é muito criticada em face da separação entre esses dois nichos de conhecimento, mas nos formula questões interessantes no plano da validade (fundamento) das normas, bem como de sua eficácia (ou seja, a legitimidade reconhecida pela sociedade).

Qual seria, dentro disso, o papel da ética? Formular um percurso pessoal dentro dos valores morais, um trilhar individual em termos de contemplação dos valores que são reproduzidos em sociedade pelo ser humano. 

Podemos destacar, dentro de tais linhas divisoras, regiões distintas entre Direito, Moral e Ética: o Direito relaciona-se com a expressão máxima de normas (estatais, sobretudo) que contém o mais universalizante caráter (basta lembrar que nosso direito é federalizado, ou seja, irradiado para todos os entes da federação, à exceção, claro, das leis locais - estaduais, municipais - que, ainda assim, são coletivizáveis), enquanto a Moral refere-se aos modelos de conduta, comportamento e valores, que são suscetíveis às diferenças entre os grupos. A Ética, nesse contexto, relaciona-se ao mais particularizado percurso, pois é a adoção de um caminhar pessoal, que toma como referência os valores morais.

Simples assim.

Uma sociedade plural - ou seja, que prestigia valores distintos de grupos distintos - e democrática será aquela em que o ordenamento jurídico - e, portanto, o Direito, permite a tutela dos direitos e deveres de todos e todas, independentemente das divergências morais entre os grupos. Qual a regra? Aderir ao ordenamento jurídico, pois, dentro de nossa opção positivada e codificada (ou seja, formal, escrita, metodologicamente disposta na lei), o preceito que outrora poderia ter sido moral, possa se convolar (transformar) em regra jurídica.


Um comentário:

Anônimo disse...

Embora o Estado seja Laico, não consigo identificar na nossa sociedade prestígio por valores distintos. A sociedade brasileira, por direito de liberdade de crença:cristã está longe disso! O respeito já é o suficiente.