segunda-feira, 18 de novembro de 2013

O segundo elemento constitutivo do crime: a ilicitude, suas irradiações

Depois da teorização do tipo penal e da tipicidade, podemos passar para o segundo elemento constitutivo do crime, qual seja, a ilicitude ou antijuridicidade, que nada mais é do que a contradição entre a realização do tipo de uma norma proibida e o ordenamento jurídico como um todo, ou seja, o fato que contraria o ordenamento jurídico 

Na doutrina há quem entenda - na seara de Telle, por exemplo - pela divisão em ilicitude formal, consistente na violação da mera norma em si, no comando abstrato da descrição e ilicitude material, que leva em consideração a lesão ao bem jurídico protegido pela norma respectiva. 

A ilicitude tem como função principal a gradação do injusto e influência na dosimetria da pena, como também admitiria causas supralegais de justificação da conduta.  Para uma concepção unitária ela é uma relação de antagonismo que se estabelece entre uma conduta humana voluntária e o ordenamento jurídico, de modo a causar lesão ou expor a perigo de lesão um bem jurídico tutelado (ASSIS FRANCISCO TOLEDO).  

O que são excludentes de ilicitude? São "autorizações"que tornam as ações respaldadas pelo ordenamento jurídico. Assim, nada obstante serem típicas, são lícitas, a exemplo da legítima defesa. A doutrina dá vários nomes: causas de exclusão de ilicitude / exclusão da ilicitude  / causas de justificação / justificativas / excludentes / eximentes / descriminantes / excludentes de ilicitude.

Temos causas legais (art. 23) e supralegais de exclusão de ilicitude. As legais, como o nome diz, encontram-se definidas na lei, tanto no art. 23 como em algumas disposições da parte especial (art. 128), enquanto as supralegais não estão na lei, a exemplo do consentimento do ofendido, sempre que o bem jurídico for disponível (ver o art. 163 e o art. 148).

O estado de necessidade é reconhecido em todas as épocas do desenvolvimento do homem, por meio da existência de uma reconhecida situação de perigo atual, involuntário, no qual o agente sacrifica parcial ou integralmente um bem, próprio ou de terceiro, em prol da manutenção do outro bem remanescente, cuja existência não poderia ser sacrificada. 

Gosto de enumera requisitos para facilitar a subsunção: 

Perigo atual: concreto, real, acontecendo no momento, às portas da lesão, e não o perigo que já passou, nem o prestes a acontecer. 

Involuntariedade do perigo: dolo do agente. Exemplo da explosão do navio por Tércio, que mata Gomes para ficar com a última bóia.

Inevitabilidade do sacrifício do bem jurídico: sempre que existir outra opção mais branda, afasta-se a figura da excludente, pois o agente poderia ter optado por esta via. Arrastão.

Direito próprio ou de terceiro: bens jurídicos que se encontram em questão (vida, patrimônio, saúde, família, liberdade), relacionados à pessoa, ou ao terceiro. 

Inexigibilidade de sacrifício: proporcionalidade entre os bens jurídicos. Ou seja, ponderamos se é possível ofender ou destruir um para manutenção do outro.

Ausência do dever de arrostar o perigo: policiais, bombeiros, enfermeiras, etc. (art. 24, §1º)

Elemento subjetivo: ciência da justificante. A maioria da doutrina fala em ciência, em virtude do princípio ético que inspira esta excludente. No estado de necessidade putativo ocorre a virtualidade da existência do estado, que afasta (segundo o art. 20 ou 21).

A legítima defesa constitui repulsa a uma agressão injusta, atual ou iminente, a qualquer direito, próprio ou alheio, por intermédio do usos moderado dos meios tidos como necessários para cessar a ação. Tal qual o estado de necessidade possui elementos: 

Agressão injusta: comportamento tendente a uma lesão ao bem jurídico (ex: desferir um tiro ante ao perigo de outro).

Agressão atual ou iminente: estar acontecendo, ou prestes a acontecer, ao contrário do estado de necessidade. Com isso, por exemplo, a agressão passada torna o ato vingativo, longe da incidência da justificante.

Direito próprio ou de terceiro: titular do direito é a própria pessoa que está agindo, ou outra. 

Uso dos meios necessários: quando não outra opção a ser usada para cessar a agressão. Uso de critério de razoabilidade.

Uso moderado: ponderação, sem exageros, ou excesso.

Consciência da justificante: noção de se encontrar em estado de legítima defesa. Delmanto faz referência a não obrigatoriedade de existência da ciência, em virtude do princípio da legalidade. Alguns casos são relatados na doutrina, a exemplo da embriaguez do defendente. Duas correntes doutrinárias; uma, considerando que o ébrio, sob o pálio do álcool, teria comprometida sua consciência, de tal forma que, excluída a própria ideia de consciência da excludente, faltar-lhe-ia a justificante. Já a embriaguez do agressor não impede que o cidadão, por conta da embriaguez, provoque injusta agressão.

Algumas diferenças entre legítima defesa e estado de necessidade: existe o caráter valorativo de colisão entre bens jurídicos no estado de necessidade, ao passo que, na legítima defesa, tem-se um ataque injusto de um ser humano. Já entre a legítima defesa e erro na execução o erro na execução não altera o desiderato na legítima defesa, incidindo a regra do art. 73 e do art. 74 do CPB. E entre a legítima defesa e ofendículos: obstáculos ou engenhos (cacos de vidro, cercas eletrificadas, cães de guarda, etc.) utilizados para a defesa de propriedade, dividindo-se a doutrina entre serem os mesmos exercício regular de direito ou, ainda, legítima defesa. Instalação (exercício regular de direito). 

O estrito cumprimento do dever legal constitui comportamento autorizado nos limites da lei, como justificativa para os agentes (prisão em flagrante, danificação do patrimônio perpetrada pelo oficial de justiça). Importante a ciência da justificante.

O exercício regular de direito, ao contrário do exercício anterior, é uma prerrogativa, uma faculdade colocada à disposição do agente, como, p. e., acontece no caso de prisão perpetrada pelo particular, ou, ainda, a defesa da posse tratada no art. 502 do CC.

O consentimento do ofendido é uma causa supralegal, ora tratada como excludente de ilicitude, ora como de tipicidade (se, no interior do tipo contém um elemento que, extraído, retira a tipicidade, ex vi o art. 150, quando se faz referência ao consentimento).

Importante ressaltar que o excesso nas excludentes faz com que o agente responda nos termos do art. 23 do CPB. No excesso doloso existe a medida de seu desiderato na contenção ou realização da causa justificante. No excesso culposo, se previsto em lei, responderá pelo mesmo o agente, enquanto no excesso acidental não se fala em culpa sequer.




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