segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Por uma teoria jurídica do crime: conceitos e mais conceitos

Imagino a surpresa dos alunos e das alunas quando, no primeiro dia de aula, 
falamos que o conceito jurídico de crime, bem como a maneira como a 
dogmática trabalha o conceito é completamente distinta do senso comum. 

Costumo sempre começar com uma brincadeira ingênua, dando conta de uma 
situação-problema na qual os alunos se deparem - ao entrar na sala - com 
um cadáver imerso em uma poça de sangue de 5 metros de diâmetro, um 
buraco de bala na têmpora e a arma ao lado. 

Um aluno afoito iria logo perguntar: "quem matou", mas em termos de 
pesquisa, ciência e, sobretudo, dogmática penal, acredito que a pergunta 
mais adequada seja "que aconteceu aqui?" ou, ainda "houve algum 
crime?para, aí sim, adiante, poder ser perquirida a autoria. 

Como toda ciência o Direito Penal necessita definir seu campo de estudo, 
dentro de uma metodologia adequada - ainda positivista - e que não atribua 
em demasia conteúdos extrapenais que poderiam contribuir para o 
afrouxamento nas regras de definição do que é crime. 

Assim, o conceito de crime é elaborado ante a necessidade de se estruturar 
uma teoria coesa sobre o que é entendido como crime, uma vez existirem, 
por exemplo, condutas que são consideradas crime em determinados locais, 
sendo irrelevantes em outros. Ou, ainda, o grau de reprovação ser maior ou 
menor (ex: adultério para o Brasil e o mesmo para o Afeganistão).

Em um primeiro momento pode-se partir de um conceito formal, que se 
interessa pelo aspecto externo, formatação do crime, revestimento e que se 
pauta no que é explícito a partir do conteúdo da lei penal. Para MAGGIORE 
crime é qualquer ação punível, bem como para FRAGOSO constitui toda ação 
ou omissão proibida pela lei, sob ameaça de pena. Com isso, o crime sob a 
perspectiva ontológica da definição legal: é o que a lei penal define como 
tal. Seria suficiente esse conceito?

Acredito que não, pois o mero aspecto formal não leva em consideração o 
conteúdo do que o legislador considera relevante em termos de bem jurídico, 
exsurgindo, então uma concepção material, que diz respeito ao estudo 
pormenorizado das profundezas do delito, entendendo-se, assim, sua 
essência. Conteúdo teleológico pelo qual se categorizam certas condutas 
como crime. Tem como base o aspecto social, no que diz respeito ao que a 
sociedade entende como sendo objeto da valoração e da tutela jurídico-penal.

Daí para FRAGOSO crime constituir ação ou omissão que, a juízo do 
legislador, contrasta violentamente com valores ou interesses do corpo 
social, de modo a exigir seja proibida sob a ameaça de pena. Ou 
para MANZINI: delito é a ação ou omissão, imputável a uma pessoa, lesiva 
ou perigosa a interesse penalmente protegido, constituída de determinados 
elementos e eventualmente integrada por certas condições, ou acompanhada 
de determinadas circunstâncias previstas em lei.

A dogmática jurídica, em sua independência epistemológica, elaborou ao 
longo dos séculos conceitos jurídicos, definições sobre o crime, formatando o 
que se chama de conceito analítico, que nada mais é do que o pilar de 
sustentação do estudo da dogmática jurídico-penal. Tentativa de redução a 
um conceito puro do que vem a ser o crime em aspectos jurídicos.

Daí por DEFINIÇÃO, ainda que com nuances, crime ser uma conduta (ou fato) 
típica, ilícita e culpável. Com isso temos dois elementos centrais: um de 
natureza fenomênica, uma CONDUTA (que está no plano físico) que será 
VALORADA segundo os componentes mencionados. Uma importante 
consideração surge daí: o crime é um somatório entre MUNDO REAL (FATO, 
ATO, COMPORTAMENTO) e a VALORAÇÃO DADA PELO DIREITO. 

Outra importante consideração: no CBP (Código Penal Brasileiro) não existem 
crimes, e sim TIPOS PENAIS, tendo em vista que o perfazimento do conceito 
de crime se faz com um ELEMENTO DO MUNDO FACTÍVEL (conduta, ato, fato) 
e uma VALORAÇÃO ELABORADA PELO DIREITO (típica, ilícita e culpável). 

A despeito de os gregos e os romanos fazerem diferença entre crime e delito, 
para o direito brasileiro inexiste distinção, pois ambos refletem a 
ofensividade ao bem jurídico tutelado. Uma importante distinção, contudo, 
consiste na separação dada pela lei entre crime e contravenção penal, 
também chamado de delito anão ou crime anão. 

A LCP traz um rol de condutas que usualmente têm sanção mais abrandada 
do que as contidas no CBP e nas legislações esparsas. Daí ser meramente 
político-criminal o critério para a separação entre o que é crime e o que é 
contravenção penal, mesmo que, a bem da verdade, em face do quantitativo 
da pena aplicada, bem como do modelo de cumprimento - detenção - isso 
aloje a contravenção em uma ofensividade menor, passível de 
encaminhamento para o Juizado Especial Criminal.

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