segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Sobre uma teorização das fontes do Direito e as técnicas de hermenêutica

Sempre que falamos em Direito procuramos saber de onde vem essa realidade normativa plúrima, que engloba uma dimensão epistemológica, normativa, axiológica, factual e intersubjetiva, pois entender o presente supõe saber a gênese do Direito como meio ordenador da sociedade. 

Hans Kelsen em Teoria pura do direito” simplificou o problema das fontes, acreditando que a norma jurídica era a maior referência de criação, já que define direitos objetivos (lembrando que refuta os direitos subjetivos). Já Miguel Reale entende que o processo legislativo, a jurisdição, os usos e costumes e o poder negocial são fontes do direito. Tanto um como outro simplificam demais a questão, a partir do momento em que, por exemplo, deparamo-nos - principalmente no Brasil - com o ativismo judicial, a súmula vinculante e demais temas que repercutem na discussão sobre o predomínio da lei, da jurisprudência e da doutrina. 

Por fontes materiais entendem-se os processos substanciais de elaboração do que é relevante para se criar a norma, que derivam da expressão maior de uma série de demandas, a exemplo das fontes histórica, religiosa, econômica, social, política, moral etc. As fontes formais focam-se na estruturação rigorosamente formatada em um modelo positivado (não necessariamente codificado) e metódico, usualmente relacionadas ao Estado.

Por outro lado, podem as fontes formais ser imediatas ou mediatas, onde as imediatas estão diretamente relacionadas coma expressão do poder republicano de impingir regras para cumprimento. A lei, nesse sentido, constitui fonte formal (emana do Estado) imediata, porque dentro do esquadrinhamento dado pelo Estado ela deriva diretamente do poder do povo e se revela na CF/88.

Já as fontes mediatas são a doutrina, jurisprudência, costumes. A doutrina constitui a resultante do compêndio dos jurisconsultos que se ocupam de estudar os institutos. Já a jurisprudência é o vetor das decisões em sede de tribunais. Importante aqui não confundir a jurisprudência (que é a consolidação do pensamento de uma corte sobre determinado assunto) com o mero acórdão, que é apenas a decisão em um caso concreto (que pode, ou não, virar jurisprudência mais abrangente e universal). 

Os costumes são a reiteração constante (com a consciência vinculante) de uma prática que se estabelece como padrão, a exemplo do que acontece com o cheque pré-datado, que não tem estipulação legal, mas que tem respaldo perante o Judiciário.

Tanto a jurisprudência quanto os costumes podem ser praeter legem, secundum legem ou contra legem. Praeter legem é tudo aquilo se que coloca como primeira forma de interpretação (primeira lei), ou seja, no silêncio ou na inexistência de norma, a jurisprudência interpreta soberanamente. Por exemplo, não existe uma definição legal para o início do dia ou seu fim, para fins de citação de uma pessoa, daí o STF entender no período entre 06h00 e 18h00 a fixação. Outro exemplo: o STJ e o STF definiram os critérios para se visualizar a insignificância no caso concreto, sendo isso uma integração praeter legem

Já a hipótese contra legem ocorre quando na jurisprudência se adota uma orientação nitidamente contrária ao dispositivo legal. Em um julgamento de um HC no STF num caso de estupro em que a vítima tinha 12 anos (mas, segundo o Ministro, era capaz de consentir na relação sexual) houve o afastamento da presunção da violência sexual, mesmo a norma dizendo o contrário.

Todas essas percepções nos encaminham para um problema central dentro do Direito: a hermenêutica, que é a ciência da interpretação da norma para se depreender ante a dado contexto, qual o conteúdo da norma, bem como o alcance de sua emanação. Alguns métodos são aplicados:

método literal, semântico ou gramatical: diz respeito à primeira atividade, que é a leitura do preceito contido na lei para, depois, compreender o significado da norma.

método lógico-sistemático: concebe as normas contextualizadas e harmonizadas dentro do ordenamento jurídico como um todo, correlacionando-as. 

método históricoenfatiza os acontecimentos históricos ocorridos e registrados, A PARTIR de três procedimentos: Heurística, ou pesquisa de fontes (recolhimento de todas as informações disponíveis); crítica (avaliação da validade ou não das versões contraditórias); síntese (definição de dados e informações para o quadro global do que está sendo investigado). Acho problemático no Direito, porque dada nossa superficialidade, tendemos a fazer anacronismo, ou seja, olhar o passado a partir de hoje, sem a contextualização e inserção no ontem. 

método histórico-evolutivo: a partir da elaboração da lei, parte do pressuposto que ela se destaca do legislador e adquire vida própria, "evoluindo" junto com a sociedade.

método teleológico: leva em consideração a finalidade para a qual a lei - e a norma- foi elaborada. 

método dialético: base para uma interpretação dinâmica e totalizante da realidade, POIS os fatos sociais não podem ser entendidos quando considerados isoladamente, abstraídos de suas influências políticas, econômicas, culturais etc. Por outro lado, como a dialética privilegia as mudanças qualitativas, opõe-se naturalmente a qualquer modo de pensar em que a ordem quantitativa se torne norma. Três grandes princípios: a) A unidade dos opostos. Todos os objetos e fenômenos apresentam aspectos contraditórios, que são organicamente unidos e constituem a indissolúvel unidade dos opostos. Os opostos não se apresentam simplesmente lado a lado, mas num estado constante de luta entre si. A luta dos opostos constitui a fonte do desenvolvimento da realidade. b) Quantidade e qualidade. No processo de desenvolvimento, as mudanças quantitativas graduais geram mudanças qualitativas e essa transformação opera-se por saltos. c) Negação da negação. A mudança nega o que é mudado e o resultado, por sua vez, é negado, mas esta segunda negação conduz a um desenvolvimento e não a um retorno ao que era antes.

Quanto ao resultado, a interpretação pode ser declarativa, restritiva ou extensiva. Declarativa quando seu alcance não amplia o que está descrito na lei. Restritiva quando se limita o alcance da norma e extensiva quando se amplia o conteúdo da norma, tendo em vista que ela diz pouco. 

Quanto à fonte, pode ser autêntica, doutrinária ou jurisprudencial. Diz-se autêntica quando o próprio órgão que elaborou a lei faz definições, a exemplo do Código Penal que define nos arts 24 e 25 o estado de necessidade e a legítima defesa. Ou seja, o próprio legislador definiu. Doutrinária é aquela feita pelos jurisconsultos e jurisprudencial decorre da atividade dos tribunais.

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